sábado, maio 11, 2013

Evolução

A mesa do café onde me reúno de demasia em demasiado tempo com os meus amigos, vai vendo os seus lugares serem ocupados aos poucos. Uma vez ou outra, junta-se à volta da fogueira inexistente uma pessoa que não foi previamente convidada: um encontro do acaso, que reconhecemos e que convidamos naquele momento para se sentar e pôr a conversa em dia... e normalmente, nestes casos há uma extensa conversa para ser posta em dia, normalmente com pontos de vista, vivências e opiniões bem diferentes daquilo que eu vejo, vivo ou penso.

Assim, fala-se de tambores gritantes, carroças musicais e ranchos populares tudo no seguimento do convite para comemorar uma festa de anos de um grupo que não me agrada, rodeado de uma bebida que não me mata a sede. Recuso o convite numa nota mental e digo oralmente que vou ver se consigo ir. Não fui!

Disse escrevendo, José Saramago, que contar dois acontecimentos que tenham ocorrido ao mesmo tempo é injusto para um deles, porque acaba por ser contado sempre em segundo lugar... Apesar disso, deverá ter sido à mesma hora que a festa estoirava na tenda ao lado do mercado que eu me apercebi de mais um fantástico e poderoso mecanismo de segurança do nosso pensamento.

Eu não vou à festa da carroça, da mesma forma que o bailante não trabalha para ganhar um prémio Nobel (bem, na verdade nem eu... mas gostava). Num instante, porque o pensamento tem a capacidade de ocorrer num espaço de tempo tão curto que as imagens quase surgem ao mesmo tempo, caras familiares lembram-me momentos pontuais da nossa vivência em conjunto. A ideia relembrada é de que "não vou conseguir, para que tentar?"

Quantas coisas recusamos à partida por sabermos que não somos capazes de as atingir? Encostamos-nos à sombra de uma ideia abanada, para não termos o desprazer de fracassar no caminho, de nos ferirmos na batalha ou de morrermos de bandeira branca erguida. Parece que nós mesmos, nos metemos a nós próprios apenas onde nós conseguimos nos superar... tudo o que for superior a isso é por nós imediatamente recusado. Quando mais acessível for o objectivo, menor a queda em caso de queda.

A questão em que interessa ainda pensar é quantas são as coisas que perdemos, por não nos metermos na posição em que nos devíamos ter metido? Corremos o risco de estagnar, se não esticarmos o pescoço o suficiente para chegar às folhas que estão onde apenas as girafas chegam. No que toca ao nosso desenvolvimento pessoal, intelectual e social, pelo menos... pelo menos a estes, as ideias Lamarquistas não são assim tão disparatadas.

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